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sábado, 4 de junho de 2011

Cada um é o que apresenta, no instante grave, quando se destravam as represas íntimas que disfarçam comportamentos e dissimulam condições.

Suicídio de Judas

Isso é lá contigo


As colinas áridas de calcáreo cinza, faziam a moldura além dos muros de uma cidade áspera e rígida em mesmas características: dureza e desolação.
Aqui longe, raros bosques de oliveiras e ciprestes audazes contrastando o verde escuro em manchas de sombra agradável com o solo agreste, pedroso, onde, de raro em raro, a balsamina e os cardos medravam.
Numa das baixadas, a nascente de Siloé, refrescante, alongada em corrente tranquila, generosa e abenõada, representante da vida.
O Templo, erguido por Zoroabel após sua destruição, demonstrava o orgulho da raça, que padecia uma forma de rude e infeliz cativeiro nas hábeis garras da águia romana.
Em extremos opostos, os palácios de Herodes ântipas e de Caifás, ostentando luxo e exalando o bafio pestilencial das lutas polico-religiosas, sob o olhar atento da Torre Antônia, nas cercanias da opulenta residência de Pilatos.
As ruelas calçadas e estreitas apertavam-se, como osmcorações temerosos que necessitam de apoio, onde são escassas a confiança e a amizade, a paz e a bondade.
A fé religiosa convertera-se, então, em recitativos exaurintes e monótonos com movimentos rítmicos da cabeça e do corpo, ocultando os sentimentos reais e disfarçando, pela aparência, a falta de uma atitude mental e emocional correta.
Os jogos dos interesses subalternos predominavam, dando asas a astúcia e a desonestidade que campeavam, em detrimento da honradez que já não existia.
As oferendas religiosas variavam de acordo com a intenção ou liberação do erro, de cuja responsabilidade se desejava eximir o crente, variando desde pequenos holocaustos com aves, a animais de maior porte ou gemas preciosas e metais nobres trabalhados....

Supunha-se que o dinheiro a tudo comprava e vendiam-se composturas, fidelidade, afeição, vidas....

Não seria, pois, de estranhar, que Jesus nunca passasse uma noite na orgulhosa e estranha Jerusalém!
Quando ali se encontrava, no ministério da Mensagem, retirava-se para de dentro dos seus muros e procurava, para repouso, a casa gentil dos seus amigos de Betânia, Marta, Maria e Lázaro, ou se acolhiana parte externa, no Getsêmani, à sombra acolhedora das velhas oliveiras sob o zimbório da noite estrelada.

Naquela cidade sofrida e impiedosa, onde os falcões vigiavam as pombas e os lobos as ovelhas, para as exterminar, sabia-o Ele, dar-se-ia ao seu luminoso testemunho, aquilo para o que viera.

Jesus esperou e preparou-se para a Sua hora.

As festas da Páscoa atraíam os fiéis que chegavam de toda parte.

Deveria ser nessa época...

As testemunhas levariam, por todos os lados, as notícias da morte e da vida.

O silêncio da paixão e a alvorada da ressurreição comporiam o livro da perene conquista da felicidade.

Cessados os encantamentos da entrada jubilosa entre palmas e sorrisos transitórios, os ódios foram acirrados por profissionais do terror, que se misturavam às camadas mais infelizes da população e pelos intrigantes hábeis junto aos assustados governantes, cujos tronos e posições balouçavam sem cessar, aos ventos do poder enganoso, longe de qualquer segurança.

Inquieto e emulado poe sentimentos desencontrados, fraco e atormrntado na sua insegurança, em em que tudo se comprava e vendia, Judas vendeu o Amigo...

O escândalo se daria, é certo; infeliz, porém, aquele que se tornasse o seu instrumento.

O dia morno fora substituído pela noite varrida por ventos frios.

No silêncio das sombras a escabrosidade da atitude conduzia à tragédia.

A dor maior para um amigo é a traição de outro amigo; a sua perseguição insana e contumaz; a antipatia que surge da inveja ou despeito;a contínua zombaria decorrente da pertinaz animosidade que se agasalha.

Judas, que O conhecia, não O conhecia...

O amigo que agride, maltrata, desconhece a bênção da amizade.

Aquelas eram circunstâncias cruéis, momentos aqueles inquietantes.

Em tais oportunidades revelam-se as criaturas, assumem os homens as suas reais posições.

Cada um é o que apresenta, no instante grave, quando se destravam as represas íntimas que disfarçam comportamentos e dissimulam condições.

Pelos caminhos do crescimento espiritual sempre estarão os estiletes morais, surgindo e desaparecendo nas almas, modelando-as na fornalha da aflição e nos temperos da bondade.

Nenhuma anestesia que não passe, como emoção alguma que não cesse.

Observando a condenação ao Amigo, Judas tombou no poço dos remorsos, a consciência despertou.

Pela tela da imaginação volveu ao passado. Desfilaram os momentos, que se faziam eternos, quando a comunhão do amor penetrara-o.

Aturdiu-se mais e era tarde.

Volveu ao santuário onde consumara a traição e disse a sia dor, do seu arrependimento, desejando recuperar-se...

Os compradores frios zombaram.

As suas rogativas produziram critica severa e mordaz de revolta.

- Pequei - disse entre lágrimas - traindo sangue inocente.

- Que nos importa - redarguiram, impiedosos - isto é lá contigo.

Arrojadas as moedas ao solo, fugiu, prosseguindo no rumo da outra loucura, o suicídio.

Consumado o ato infame da traição, os sacerdotes, ávidos e inditosos pela ganância, tomaram das moedas, do piso recolhidas e creram-nas indignas do tesouro do templo, esquecidos de que dinheiro é sempre neutro.

Compraram uma vida aquelas moedas de prata, que levaram ao suicídio outra.

Aplicaram-nas, então, astuciosos, na aquisição do Campo do Oleiro, que foi transformado em cemitério para forasteiros.

A dureza do solo de Jerusalém, a cidade tida por sagrada, resultava, de algum modo daqueles que a habitavam.

O coração é a Terra do homem.
O pensamento é a semente.
A ação é o seu fruto.
Respira-se no clima que se fomenta no íntimo.

Jesus nunca dormira antes, dentro dos muros de Jerusalém!.....

...E hoje, cidade santa para os judeus, para os cristãos e para os mulçumanos, o comércio das quinquilharias confunde-se com os cânticos e preces recitadas nas Igrejas, nas Mesquitas, nas Sinagogas e no "Muro das Lamentações", entre paixões de armas em punho e divididas pelos ritos das várias ortodoxias, onde, certamente, o amor não se encontra.
Jerusalém!...


Obra: SOU EU

Autor: Amélia Rodrigues

- Psicografia de Divaldo P. Franco





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