A alma e os diferentes
estados do sono
O estudo do sono fornece-nos
indicações de grande importância sobre a natureza da personalidade. Em geral
não se aprofunda muito o mistério do sono. O exame atento desse fenômeno, o estudo da alma e da sua forma
fluídica durante a parte da existência
que consagramos ao descanso, conduzir-nos-ão a uma compreensão mais alta das
condições do ser na vida do Além.
O sono possui não só propriedades
restauradoras que a Ciência não pôs no devido relevo, mas também um poder de
coordenação e centralização sobre o organismo material. Pode, além disso,
acabamos de o ver, provocar uma ampliação considerável das percepções
psíquicas, maior intensidade do raciocínio e da memória.
Que é então o sono?
É simplesmente o desprendimento
da alma, que sai do corpo.
Diz-se: o sono é irmão da morte.
Essas palavras exprimem uma verdade profunda. Sequestrada na carne no estado de
vigília, a alma recupera, durante o sono, a sua liberdade relativa, temporária,
e ao mesmo tempo o uso dos seus poderes ocultos. A morte será a sua libertação
completa, definitiva.
Já nos sonhos, vemos os sentidos
da alma, esses sentidos psíquicos, dos quais os do corpo são a manifestação
externa e amortecida, entrar em ação 54*. A visão ocular é mais que a manifestação
externa da faculdade visual, que tem a sua expressão mais ampla na visão
interna. A visão interior exterioriza-se e traduz-se pela ação dos sentidos,
tanto na física como na psíquica. No primeiro caso órgão terminal pertence ao
corpo material: no outro caso são os órgãos do corpo fluídico. A visão no sonho
é acompanhada de uma luz especial, constante, diferente da luz do dia.
À medida que as percepções
externas se enfraquecem e apagam, quando os olhos estão fechados e suspenso o
ouvido, outros meios mais poderosos despertam nas profundezas do ser. Vemos e
ouvimos com os sentidos internos. Imagens, formas, cenas à distância sucedem-se
e desenrolam-se; travam-se conversas com pessoas vivas ou falecidas. Esse movimento,
muitas vezes incoerente e confuso no sono natural, adquire precisão e aumenta
com o desprendimento da alma no sono provocado, no transe de sonambulismo e no
êxtase. Às vezes, a alma afasta-se durante o descanso do corpo e são as
impressões das suas viagens, os resultados das suas indagações, das suas
observações, que se traduzem pelo sonho.
Nesse estado, um laço fluídico
ainda a liga ao organismo material e, por esse vínculo sutil, espécie de
fio condutor, as impressões e as
vontades da alma podem transmitir-se ao cérebro. É pelo mesmo processo que, nas
outras formas do sono, a alma governa o seu invólucro terrestre, fiscaliza-o,
dirige-o.
Essa direção, no estado de
vigília, durante a incorporação, exercita-se de dentro para fora; efetuar-se-á em
sentido inverso nos diferentes estados de desprendimento. A alma, emancipada,
continuará a influenciar o corpo mediante o laço fluídico que continuamente
liga um à outra. Desde esse momento, no
seu poder psíquico reconstituído, a alma exercerá sobre o organismo carnal uma
direção mais eficaz e segura. A marcha dos sonâmbulos à noite, em lugares
perigosos e com inteira segurança, é uma demonstração evidente desse fato.
Sucede o mesmo com a ação
terapêutica provocada pela sugestão. Esta é eficaz, principalmente no sentido
de facilitar o desprendimento da alma e dar-lhe o poder absoluto de
fiscalização, a liberdade necessária para dirigir a força vital acumulada no
perispírito e, por esse meio, restaurar as perdas sofridas pelo corpo físico 55*. O espírito exteriorizado pode tirar do organismo mais força
vital do que o homem normal, o homem encarnado, pode obter. Foi demonstrado por
experiências que um espírito pode, através do organismo, exercer maior pressão
num dinamômetro do que o espírito encarnado.
Comprovamos esse fato nos casos
de personalidade dupla. A segunda personalidade, mais completa, mais integral que a personalidade
normal, substitui-a para um fim curativo, por meio de uma sugestão exterior,
aceita e transformada em auto sugestão pelo Espírito do sujet. Com efeito, este nunca abandona os
seus direitos e poderes de fiscalização. Assim, como disse Myers, “não é a
ordem do hipnotizador, mas antes a faculdade do paciente que forma o nó da
questão” 56*. F.Myers – La Personalité Humaine, pag.204.
O sábio professor de Cambridge
disse mais 57*:Idem,
pag. 187.
“O fim único de todos os processos
hipnogênicos é dar energia à vida; é alcançar mais rápida e completamente
resultados que a vida abandonada a si mesma só realiza lentamente e de forma
incompleta.” Por outros termos, o hipnotismo é a aplicação, num grau mais
intenso, das energias reparadoras que entram em jogo no sono natural. A
sugestão terapêutica é a arte de libertar o Espírito do corpo, de abrir-lhe uma
saída pelo sono e permitir-lhe que exerça com plenitude os seus poderes sobre o
corpo doente. As pessoas sugestionáveis são aquelas cujas almas indolentes ou
que pouco têm evolvido não estão aptas para desprenderem-se por si mesmas e
agir utilmente no sono ordinário para restaurar as perdas do organismo.
A sugestão em si mesma não é,
pois, mais do que um pensamento, um ato da vontade, diferindo somente da
vontade ordinária por sua concentração e intensidade. Em geral, os nossos
pensamentos são múltiplos e hesitantes. Nascem e passam ou, então, quando
coexistam em nós, chocam-se e confundem-se.
Na sugestão, o pensamento e a
vontade fixam-se num ponto único. Ganham
em poder o que perdem em extensão. Por sua ação, que se torna mais penetrante,
mais incisiva, provocam no sujet o despertar de faculdades não utilizadas no
estado normal. A sugestão torna-se, então, uma espécie de impulso, de alavanca
que mobiliza a força vital e dirige-a para o ponto onde ela tem de operar.
A sugestão pode exercer-se tanto
na ordem física, por uma influência direta sobre o sistema nervoso, quanto na
ordem moral, sobre o “eu” central e a consciência do sujet. Bem empregada, constitui ela um meio
muito apreciável de educação, destruindo as tendências ruins e os hábitos
perniciosos. A sua influência sobre o caráter produz, então, os mais felizes
resultados 58*.Em
resumo, os frutos que a sugestão hipnótica pode e deve proporcionar e em vista
dos quais e deve aplicar, são estes: concentração do pensamento e da vontade,
aumento de energia e vitalidade, atenção fixa em coisas essencialmente úteis,
alargamento do campo da memória, manifestação de sentidos novos por meio de
impulsões internas ou externas.
Voltemos ao sono ordinário e ao
sonho. Enquanto o desprendimento da alma é incompleto, as sensações, as preocupações da vigília e as recordações
do passado misturam-se com as impressões da noite. As percepções registradas
pelo cérebro desenrolam-se automaticamente, em desordem aparente, quando a
atenção da alma está desviada do corpo e deixa de regular as vibrações
cerebrais. Daí a incoerência da maior parte dos sonhos; mas, à medida que a
alma se desprende e se eleva, a ação dos sentidos psíquicos torna-se
predominante e os sonhos adquirem lucidez e nitidez notáveis. Clareiras cada
vez mais largas, vastas perspectivas abrem-se no mundo espiritual, verdadeiro
domínio da alma e lugar do seu destino. Nesse estado ela pode penetrar as
coisas ocultas e até os pensamentos e os sentimentos de outros Espíritos 59*. Segundo os antigos,
existem duas espécies de sonhos: o propriamente dito em grego, “onar”, é de
origem física, e o sonho “repar”,de origem psíquica. Encontra-se essa distinção
em Homero, que representa a tradição popular, assim como em Hipócrates, que é
representada na tradição científica. Muitos ocultistas modernos adotaram
definições análogas. Em tese geral, segundo eles dizem, o sonho propriamente
dito seria um sonho produzido mecanicamente pelo organismo, e o sonho psíquico,
um produto da clarividência adivinhadora; ilusório um, verídico o outro. É,
porém, às vezes, muito difícil estabelecer uma limitação nítida e distinta
entre essas duas classes de fenômenos. O sonho vulgar parece devido à vibração
cerebral automática, que continua a produzir-se no sono, quando a alma está
ausente. Estes sonhos são muitas vezes absurdos; mas este mesmo absurdo é uma
prova de a alma está fora do corpo físico e deixou de regular-lhe as funções.
Com menos facilidade nos lembramos do sonho psíquico, porque não impressiona o
cérebro físico, mas somente o corpo psíquico, veículo da alma que está
exteriorizada no sono.
“Os sentidos”, diz Pascal, depois da atividade
do dia, já não produzem sensações tão
vivas e, como é a energia destas sensações que tem a consciência concentrada no
cérebro, esta consciência, quando os sentidos adormecem, escapa-se para fora do
corpo físico e fixa-se no corpo psíquico.”
O sonho lúcido representa o conjunto das
impressões recolhidas pela alma no estado de liberdade e transmitidas ao
cérebro, quer no decurso das suas migrações, quer no momento de despertar.
Poder-se-ia distingui-lo do sonho vulgar ou automático pelo fato de não causar
nenhuma fadiga, contrariamente ao que sucede com a atividade cerebral da
vigília.
Há em nós uma dupla vista, pela
qual pertencemos, ao mesmo tempo, a dois mundos, a dois planos de existência.
Uma está em relação com o tempo e o espaço, como nós os concebemos em nosso
meio planetário com os sentidos do corpo: é a vida material; a outra, mediante
os sentidos profundos e as faculdades da alma, liga-nos ao universo espiritual
e aos mundos infinitos.
No decurso da nossa existência
terrestre, é principalmente quando dormimos que essas faculdades podem
exercer-se e entrar em vibração as potências da alma. Esta torna a pôr-se em contato
com o universo invisível, que é a sua pátria e do qual estava separada pela
carne. Retempera-se no seio das energias eternas para continuar, quando
desperta, a sua tarefa penosa e obscura.
Durante o sono a alma pode,
segundo as necessidades do momento, aplicar-se a reparar as perdas vitais
causadas pelo trabalho cotidiano e regenerar o organismo adormecido,
infundindo-lhe as forças tiradas do mundo cósmico, ou, quando está acabado esse
movimento reparador, continuar o curso da sua vida superior, pairar sobre a
Natureza, exercer as suas faculdades de visão à distância e penetração das
coisas. Nesse estado de atividade independente vive já antecipadamente a vida
livre do Espírito; porque essa vida, que é uma continuação natural da
existência planetária, espera-a depois da morte, devendo a alma prepará-la não
somente com as suas obras terrestres, mas também com as suas ocupações quando
desprendida durante o sono. É graças ao reflexo da luz do Alto, que cintila em
nossos sonhos e ilumina completamente o lado oculto do destino, que podemos
entrever as condições do ser no Além.
Se nos fosse possível abranger
com o olhar toda a extensão de nossa existência, reconheceríamos que o estado
de vigília está longe de constituir lhe a fase essencial, o elemento mais
importante. As almas que de nós cuidam servem-se do nosso sono para
exercitar-nos na vida fluídica e no desenvolvimento dos nossos sentidos de
intuição. Efetua-se, então, um trabalho
completo de iniciação para os homens ávidos de se elevarem.
Os vestígios desse trabalho
encontram-se nos sonhos. Assim, quando voamos, quando deslizamos com rapidez
pela superfície do solo, significa isso a sensação do corpo fluídico,
ensaiando-se para a vida superior.
Sonhar que subimos sem cansaço,
com facilidade surpreendente, através do espaço, sem embaraço nem medo, ou
então que estamos pairando por cima das águas; atravessar paredes e outros
obstáculos materiais sem ficarmos admirados de praticar atos que são
impossíveis enquanto estamos acordados,
não é a prova de que nos tornamos fluídicos pelo desprendimento? Tais
sensações, tais imagens, que comportam completa inversão das leis físicas que
regem a vida comum, não poderiam vir ao nosso espírito, se não fossem o
resultado de uma transformação do nosso modo de existência.
Na realidade, já não se trata
aqui de sonhos, mas de ações reais praticadas em outro domínio da sensação e
cuja lembrança se insinuou na memória cerebral. Essas lembranças e impressões
no-lo demonstram bem. Possuímos dois corpos, e a alma, sede da consciência,
fica ligada ao seu invólucro sutil, enquanto o corpo material está deitado e em
completa inércia.
Apontemos, todavia, uma
dificuldade. Quanto mais a alma se afasta do corpo e penetra nas regiões
etéreas, tanto mais fraco é o laço que os une, tanto mais vaga a lembrança ao
acordar. A alma paira muito longe na imensidade e o cérebro deixa de registrar
as suas sensações. Daí resulta não podermos analisar os nossos mais belos
sonhos. Algumas vezes, a última das impressões sentidas no decurso dessas
peregrinações noturnas subsiste ao despertar.
E se, nesse momento, tivermos o
cuidado de fixá-la fortemente na memória, pode ficar lá gravada. Tive, uma
noite, a sensação de vibrações percebidas no espaço, as últimas notas de uma
melodia suave e penetrante, e a lembrança das derradeiras palavras de um
cântico que findava assim: “Há céus inumeráveis!”
Às vezes sentimos, ao acordar, a
vaga impressão de poderosas coisas entrevistas, sem nenhuma lembrança determinada.
Essa espécie de intuição, resultante de percepções registradas na consciência
profunda, mas não na consciência cerebral, persiste em nós durante certo tempo
e influencia os nossos atos. Outras vezes, essas impressões traduzem-se
nitidamente no sonho. Eis o que a respeito diz Myers 60*: F. Myers – La Personalité Humaine,
pag. 117.
“O resultado permanente de um sonho é muitas
vezes de tal ordem que nos mostra claramente que o sonho não é o efeito de uma
simples confusão com lembranças avivadas da
vida passada, mas que possui um poder inexplicável que lhe é próprio e
que ele tira, semelhante nisso à sugestão hipnótica, das profundezas da nossa
existência, a que a vida de vigília é incapaz de chegar. Desse gênero, dois
grupos de casos há que, pela clareza com que se patenteiam, facilmente podem
ser reconhecidos; um deles, principalmente, em que o sonho acabou por uma
transformação religiosa decidida, e o
outro em que o sonho foi o ponto de partida de uma ideia obsidente ou de um
acesso de verdadeira loucura.”
Esses fenômenos poderiam
explicar-se pela comunicação, no sonho, da consciência superior com a consciência
normal, ou pela intervenção de alguma Inteligência elevada que julga, reprova,
condena o proceder do sonhador, ocasionando-lhe perturbação e um salutar
receio. A obsessão pode também exercer-se por meio do sonho até a ponto de
causar perturbação mental ao despertar. Terá como autores Espíritos malfazejos,
a quem o nosso procedimento no passado e os danos que lhes causamos deram
domínio sobre nós. Insistimos também na propriedade misteriosa que tem o sono
de fazer-nos senhores, em certos casos, de camadas mais extensas da memória.
A memória normal é precária e
restrita, não vai além do círculo estreito da vida presente, do conjunto
dos fatos, cujo conhecimento é
indispensável por causa do papel que se tem de desempenhar na Terra e do fim
que se deve alcançar. A memória profunda abrange toda a história do ser desde a
sua origem, os seus estádios sucessivos, os seus modos de existência,
planetários ou celestes. Um passado inteiro, feito de recordações e sensações,
esquecido, ignorado no estado de vigília, está gravado em nós. Esse passado só
desperta quando o Espírito se exterioriza durante o sono natural ou provocado.
Uma regra conhecida de todos os experimentadores é que, nos diferentes estados
do sono, à medida que se vai ficando a maior distância do estado de vigília e
da memória normal, tanto mais a hipnose é profunda, tanto mais se acentua a
expansão, a dilatação da memória. Myers confirma o fato nos seguintes termos 61* : F.Myers – Obra citada, págs. 121 e 122
“A memória mais distanciada da
vida de vigília é a que mais vasto
alcance tem, é a que mais profundo poder exerce sobre as impressões acumuladas
no organismo. Por mais inexplicável que esse fenômeno se tenha apresentado aos
observadores, que com ele depararam sem possuírem a decifração do enigma, é
certo que as observações independentes de centenas de médicos e de
hipnotizadores atestam a sua realidade. O exemplo mais comum é fornecido pelo
sono hipnótico ordinário. O grau de inteligência que se manifesta no sono varia
segundo os sujets e as épocas; mas todas as vezes que esse grau é suficiente
para autorizar um juízo, achamos que existe durante o sono hipnótico a memória considerável, que não é
necessariamente uma memória completa ou razoável do estado de vigília; ao passo
que na maior parte dos sujets acordados, salvo o caso de uma injunção especial
dirigida ao “eu” hipnótico, nenhuma lembrança existe que se relacione com o
estado de sono.
O sono ordinário pode ser
considerado como ocupando uma posição que está entre a vida acordada e o sono hipnótico
profundo; e parece provável que a memória pertencente ao sono ordinário
liga-se, por um lado, à que pertence à vida de vigília e, pelo outro, à que
existe no sono hipnótico. Realmente assim é, estando os fragmentos da memória
do sono ordinário intercalados nas duas cadeias.” Myers, em apoio às suas
palavras, cita 62*F.Myers
- Obra citada, págs. 123 e 124. vários casos em que fatos retrospectivos
esquecidos, e outros dos quais o que dorme nunca teve conhecimento, se revelam
no sonho.
As experiências a que se refere
Myers (vê-las-emos quando tratarmos da
questão das reencarnações) foram levadas muito mais longe do que ele o previa,
e as consequências que daí provêm são
imensas. Não só tem sido possível, pela
sugestão hipnótica, reconstituir as menores recordações da vida atual,
desaparecidas da memória normal dos sujets, mas também reatar o encadeamento
das suas vidas passadas, já interrompido.
Ao mesmo tempo em que uma memória
mais vasta e mais rica, vemos aparecer no sono faculdades que são muito
superiores a todas as que desfrutamos no estado de vigília.
Problemas estudados em vão,
abandonados como insolúveis, são resolvidos no sonho ou no sonambulismo; obras
geniais, operações estéticas da ordem mais elevada, poemas, sinfonias e hinos
fúnebres são concebidos e executados. Há em tudo isso uma obra exclusiva do
“eu” superior ou a colaboração de entidades espirituais que vêm inspirar os
nossos trabalhos? É provável que esses dois fatores intervenham nos fenômenos
dessa ordem.
Myers cita o caso de Agassiz
descobrindo, enquanto dormia, o arranjo esquelético de ossadas dispersas que
ele tentara, por várias vezes e sem
resultado, acertar durante a vigília.
Lembraremos os casos de Voltaire,
La Fontaine, Coleridge, S. Bach, Tartini, etc., executando obras importantes em
condições análogas 63*.Ver
no Invisível, Cap.XII.
Finalmente, importa mencionar uma
forma de sonhos cuja explicação escapou até agora à Ciência. São os sonhos premonitórios, complexo de imagens e
visões que se referem a acontecimentos futuros e cuja exatidão é ulteriormente
verificada. Parecem indicar que a alma tem o poder de penetrar o futuro ou que
este lhe é revelado por inteligências superiores.
Assinalemos o sonho da Duquesa de
Hamilton, que viu com antecipação de quinze dias a morte do Conde de L... com
particularidades de natureza íntima que acompanharam esse acontecimento 64* . Proceedings, S.P.R.,XI,
pag.505.
Um fato da mesma natureza foi
publicado pelo Progressive
Thinker de Chicago, a 1.° de
novembro de 1913. Um magistrado de Hauser, M. Reed, morreu imediatamente, em
consequência de uma guinada do automóvel em que viajava. Seu filho, de 10 anos
de idade, tinha tido, por duas vezes seguidas, a visão dessa catástrofe em
todos os seus pormenores. Apesar dos avisos e das súplicas de sua mulher, M.
Reed achou que não devia renunciar ao projetado passeio, em que veio a
encontrar a morte, nas circunstâncias idênticas às percebidas no sonho da
criança.
M. Henri de Parville, no seu
folhetim científico do Journal des Débats (maio de 1904) refere um, caso
afiançado por testemunhos dignos de fé:
“Uma senhora, cujo marido
desapareceu sem deixar vestígios e que ela não pôde descobrir apesar de todas
as pesquisas a que procedeu, teve um sonho”. Um cãozinho, que por muito tempo
havia vivido na sua companhia, mas que o marido levara, aparece-lhe, dá latidos
de alegria e cobre-a de carícias. Instala-se lhe ao pé, não tira os olhos dela;
depois, passado um momento, levanta-se e começa a arranhar a porta.
Está feita a sua visita e precisa
ir-se embora. Ela abre-lhe a porta e, no sonho, segue o animal, que se afasta,
correndo; corre também atrás dele e, passado algum tempo, o vê entrar numa
casa, cujo andar térreo é ocupado por um café. A rua, a casa e o bairro gravam-se
lhe na memória, que conserva a recordação de tudo isso depois de acordada.
Preocupada com esse sonho, conta-o a três pessoas da vizinhança, que depois
deram testemunho da autenticidade dos fatos. “Decide-se, finalmente, a seguir a
pista do cão e encontra o marido na rua e na casa que vira em sonho.”
Os Annales des Sciences
Psychiques, de julho de 1905, citava dois sonhos premonitórios acompanhados de
circunstâncias que lhe dão caráter muito comovente.
Finalmente, achamos na Revue de Psychologie de la Suisse Romande,
1905, pág. 379, o caso de um mancebo que se via muitas vezes a si mesmo numa
alucinação autoscópica, precipitado do cimo de um rochedo e estendido, ensanguentado
e contundido, no fundo de um barranco. Essa premonição fatal realizou-se, ponto
por ponto, a 10 de julho de 1904, no monte du Salève, perto de Genebra.
À proporção que nos vamos
elevando na ordem dos fenômenos psíquicos, vão-se eles apresentando com maior
clareza, com maior rigor e trazem-nos provas mais decisivas da independência e
da sobrevivência do Espírito.
As percepções da alma no sono são
de duas espécies.
Verificamos primeiramente a visão
à distância, a clarividência, a lucidez; vem depois um conjunto de fenômenos
designados pelos nomes de telepatia
e telestesia (sensações e simpatias à
distância). Compreende a recepção e transmissão dos pensamentos, das sensações,
dos impulsos motrizes. Com esses fatos relacionam-se os casos de desdobramentos
e aparições designados pelos nomes de
fantasmas dos vivos. A psicologia oficial teve de verificar esses casos
em grande número, sem os explicar 65*.Ver Proceedings da Sociedade de Pesquisa Psíquicas de Londres
Todos esses fatos ligam-se entre si e formam
uma cadeia contínua. Em princípio, constituem, no fundo, um só e mesmo
fenômeno, variável na forma e intensidade, isto é, o desprendimento gradual da
alma. Vamos seguir esse desprendimento nas suas diversas fases, desde o
despertar dos sentidos psíquicos e das suas manifestações em todos os graus até
a projeção, à distância, de todo o Espírito, alma e corpo fluídico.
Examinemos primeiramente os casos
em que a visão psíquica se exerce com agudeza notável. Citamos alguns nas
nossas obras precedentes. Aqui apresentamos um, mais recente, publicado por toda
a imprensa londrina.
O desaparecimento da Srta. Holland,
processo criminal que apaixonou a Inglaterra, foi explicado por um sonho. A
polícia a procurava inutilmente. O acusado, Samuel Douglas, que estava para ser
solto, pretendia que ela havia partido para destino desconhecido. Os jornais de
Londres publicaram desenhos que representavam a casa em que morava a Srta.
Holland e o jardim da mesma casa. Uma criada viu a gravura e exclamou: “Aí está
o meu sonho!”, e indicou um lugar, ao pé de uma árvore, dizendo:
“Está ali um cadáver!” Soube-o a
polícia e, na presença dos agentes, ela confirmou as suas declarações. Explicou
que vira em sonho esse jardim e, no solo, no lugar indicado, um corpo enterrado.
A polícia mandou escavar o terreno nesse lugar e nele foi encontrado o cadáver
da Srta. Holland. Ficou provado que a criada nunca conhecera essa pessoa nem
pusera os pés nesse jardim.
C. Flammarion, na sua obra O
Desconhecido e os Problemas Psíquicos, menciona uma série completa de visões
diretas, à distância, durante o sono, resultante de um inquérito feito na França
sobre os fenômenos dessa ordem.
Vamos referir um caso mais
complicado. Os Annales des Sciences
Psychiques, de Paris, setembro de 1905 (pág. 551), contêm a relação
circunstanciada e autenticada pelas autoridades legais de Castel di Sangro (Itália),
de um sonho macabro, coletivo e verídico
“O guarda rural do Barão Raphaël
Corrado viu em sonho, na noite de 3 de março último, seu pai, falecido havia
dez anos. Exprobrou-lhe, a ele, aos irmãos e irmãs, o terem-no esquecido e,
coisa mais grave, deixarem os seus pobres ossos desenterrados pelos coveiros,
abandonados sobre a neve, por trás da torre do cemitério, à mercê dos lobos. A
irmã do guarda sonhou exatamente a mesma coisa, e o irmão, muito impressionado,
pegou na espingarda e, não obstante a tempestade
de neve que atormentava a região, dirigiu-se para o cemitério, sito num monte que
dominava a cidade. Aí, por trás da torre, entre as silvas e por cima da neve,
em que havia sinais de patas de lobo, viu ossos humanos.”
Os Annales dão depois a narrativa
circunstanciada do inquérito e das pesquisas feitas pelo juiz de paz. Estabelecem que os ossos eram, na realidade,
os do pai do guarda, que os coveiros, terminado o prazo legal, haviam
exumado. Iam eles transportá-los para o
ossuário, à noitinha, quando o frio e a neve os obrigaram a deixar o serviço
para o dia seguinte. Os documentos relativos a esse caso, que foi objeto de um
processo, estão assinados pelo tabelião, pelo juiz de paz e pelo síndico da localidade.
Foram publicadas pelo Eco del Sangro, de
15 de março de 1905.
O Prof. Newbold, da Universidade
da Pensilvânia, relata nos Proceedings of S. P. R., XII, pág. 11, vários
exemplos de sonhos, que indicam uma grande atividade da alma durante o sono e
dão ensinamentos que vêm do mundo invisível. Entre outros, citaremos o do Dr.
Hilprecht, professor de língua assíria na mesma Universidade, que num sonho
teve a revelação de uma inscrição
antiga, que até então não havia descoberto. Num sonho mais complexo, em que intervém
um sacerdote dos antigos templos de Nippur, dele recebeu a explicação de um
enigma de difícil decifração. Foram reconhecidas como exatas todas as particularidades desse sonho. As
indicações do sacerdote versavam sobre pontos de Arqueologia completamente
desconhecidos dos seres que vivem na Terra.
Convém notar que em todos esses
fatos o corpo do percipiente está em repouso e os seus órgãos físicos estão
adormecidos; mas, nele o ser psíquico continua em vigília, em atividade; vê,
ouve e comunica, sem o auxílio da palavra, com outros seres semelhantes, isto
é, com outras almas.
Esse fenômeno tem caráter geral e
dá-se em cada um de nós.
Na transição da vigília para o
sono, exatamente no momento em que os nossos meios ordinários de comunicação
com o mundo exterior estão suspensos, abrem-se em nós novas saídas para a
Natureza e por elas escapa-se uma irradiação mais intensa da nossa visão. Já
nisso vemos revelar-se uma nova forma de vida, a vida psíquica, que vai
amplificar-se nos outros fenômenos dos quais nos vamos ocupar, provando que
existem para o ser humano modos de percepção e de manifestação muito diferentes
do dos sentidos materiais.
Depois dos fenômenos de visão no
sono natural, vamos apresentar um caso de clarividência no sono provocado.
O Dr. Maxwell, advogado geral no
Supremo Tribunal de Bordéus, provoca na Sra. Aguillana, sujet muito sensível, o
sono magnético. Ela desprende-se, exterioriza-se, afasta-se em espírito da sua
morada. O Dr. Maxwell manda-lhe observar, a
certa distância, o que está fazendo um seu amigo M. B... Eram 10:20 da
noite. Damos a palavra ao experimentador 66*:J.Maxxwelll – Les Phenoménes Psychiques,
pag.173, F. Alcan, Paris, 1903.
“A médium, com grande surpresa
nossa, disse-nos que estava vendo M. B..., meio despido, a passear descalço
sobre pedra. Pareceu-me que isso não tinha sentido algum. No dia seguinte
ofereceu sê-me ensejo de ver o meu amigo”.
Mostrou-se muito admirado com o
que lhe contei e disse-me textualmente: “Ontem, à noite, não me senti bem. Um
amigo meu, M. S..., que mora comigo, aconselhou-me que experimentasse o sistema
Kneip e instou tanto que, para
satisfazê-lo, fiz pela primeira vez, ontem, à noite, a experiência de passear
descalço na pedra fria. Estava efetivamente meio despido quando a fiz. “Eram 10
horas e 20 minutos e passeei durante algum tempo nos degraus da escada, que é
de pedra.”
Os casos de clarividência no
estado de sonambulismo são numerosos. Vêm relatados em todas as obras e
revistas que se ocupam especialmente desses assuntos.
A Médecine Française, de 16 de
abril de 1906, refere um fato de clarividência relativo às minas de Courrières.
A Sra. Berthe, a vidente consultada, descreveu com exatidão um desabamento na
mina e as torturas impostas aos sobreviventes, cuja morte ou libertação ela
anunciou.
Ajuntemos dois exemplos recentes:
“O Sr. Louis Cadiou, diretor da
Usina de la Grand-Palud, perto de Landerneau (Finistère), tendo desaparecido em
fins de dezembro de 1913, não se lhe podiam descobrir os traços, apesar das
buscas minuciosas. Das sondagens efetuadas na ribeira do rio Elorn nenhum
resultado adveio. Uma vidente, moradora em Nancy, a Sra. Camille Hoffmann,
tendo sido consultada, declarou, em estado de sono magnético, que o cadáver seria encontrado na orla de um
bosque vizinho à usina, oculto sob ligeira camada de terra. Por essas
indicações, o irmão da vítima descobriu, depois, o corpo em uma situação
idêntica à que a vidente tinha descrito.
Todos os jornais, entre outros o
Le Matin, de 5 de fevereiro de 1914, relatam pormenorizadamente o caso
Cadiou, que toda a França acompanhou com apaixonado
interesse. Alguns dias depois, produziu-se fenômeno análogo. Havendo-se afogado
no Saóne, perto de Màcon, um jovem chamado Charles Chapeland, seu irmão
recorreu à Sra. Camille Hoffmann para encontrar o cadáver. Ela assegurou que
ele seria lançado pelas águas, 60 dias depois do acidente, perto da portagem de
Cormoranche, o que se realizou exatamente 67*. Ver Le Martin, de 23 de Fevereiro de 1914.
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