Ramatis, Pietro Ubaldi, Roustaing e Edgar Armond
há muito tempo estão na berlinda e seus
críticos já dissecaram suas obras de cabo a rabo. Considerei que o que já foi
dito bastasse para o público compreender os equívocos que esses escritores
cometeram em relação à Doutrina Espírita. Todavia numa roda de amigos, em que
falávamos sobre Espiritismo veio à baila esses personagens e fiz rápida
explanação sobre as trajetórias deles pelo movimento espírita brasileiro. E
qual não foi a minha surpresa quando um companheiro, com boa bagagem de
conhecimento doutrinário me disse: "Agora, sim, estou entendendo certas
críticas referentes a essas figuras. Creio que o grosso do movimento espírita
fica um tanto confuso diante das críticas que se fazem a eles porque não os
conhecem de uma maneira mais global. Por que você não escreve sobre esse
assunto?".
-
Não escrevo, porque não me acho capaz de fazer um trabalho melhor do que aquilo
que já está na praça! Foi o que eu disse ao meu interlocutor, procurando
eximir- me de tão difícil tarefa. E ele me deu o cheque mate:
-
Escreva o que você acabou de nos dizer que basta!'
Prometi-lhe
refletir melhor sobre a sugestão. Dias após. Conclui que a sugestão tinha sua
razão de ser e me propus a passar para o papel o seguinte:
é
um Espírito que há muito se infiltrou no movimento espírita brasileiro com a
cumplicidade do médium paranaense Hercílio Maes. Juntos, Espírito e médium
escreveram várias obras, que deixam muito a desejar quanto a pureza
doutrinária. Eis algumas delas: "Fisiologia da Alma", "O
Evangelho à luz do Cosmo", "Elucidações do Além", "Magia de
Redenção", "Mediunismo", "Mediunidade de Cura", "Missão
do Espiritismo" e outras. Não se pode negar que Ramatis é bastante
inteligente e muito sagaz e, portanto sabe disfarçar seu desconhecimento
doutrinário, ou incoerência consciente doutrinária. Logo ganhou adeptos
fervorosos e seus livros invadiram o nosso meio. Suas obras não só apresentam
senões doutrinários, mas também fortes pitadas de orientalismo, verdadeiros
enxertos inconvenientes à Doutrina Espírita. Mas sendo sagaz como é não deixa
de expressar aqui e ali pensamentos razoáveis, com pretensão estudada de
confundir o público leigo. Desde sua estréia no movimento espírita nacional a
crítica o tem sob sua mira, mas a coisa ficou feia mesmo foi quando veio a lume
"Vida no Planeta Marte", em que ele foi longe demais e desvelou suas
fantasias. A crítica especializada desceu-lhe o porrete, mas nessa altura esse
Espírito já tinha feito escola por aqui e até hoje há espíritas (ou melhor,
pretensos espíritas) que se arrepiam ante qualquer análise desfavorável à obra
ramatisiana. No meu conceito Ramatis é espiritualista, mas não espírita.
Nasceu
na Itália e acabou, graças a alguns mecenas, radicando- se no Brasil.
Desenvolveu sua mediunidade à margem dos ditames espíritas. Não sei se ele
chegou a estudar as obras kardeceanas, se chegou não deve tê-las aceitado
integralmente. Kardec nunca lhe foi um paradigma. Ele sempre quis voar mais
alto. Tinha idéias próprias e não iria submeter-se à Codificação Espírita. Mas
como o brasileiro é um eterno louvador do que vem de fora, Ubaldi em pouco
tempo fez aqui grandes amigos espíritas, alguns destes até muito importantes
dentro do nosso meio, o que lhe facilitou o seu percurso no Brasil. Certa vez,
em Pedro Leopoldo, MG chegou mesmo a sentar-se ao lado de Chico Xavier para
psicografar uma mensagem. Sua linguagem mediúnica, porém, nunca teve a
simplicidade e a claridade que vemos na linguagem xaveriana. Ficou por aí
apresentando seus ensaios filosóficos que nada tinham com o Espiritismo
autêntico. Sua preocupação, na verdade, sempre foi a de criar um movimento
próprio: o ubaldismo. Teve ímpeto de explicar a essência de Deus. Veja só até
onde pode chegar um homem incensato. Seu livro de maior alcance foi "A
Grande Síntese". O movimento espírita brasileiro se deslumbrou diante
dessa obra. Mas muitos que a leram não a entenderam, apenas louvaram, pois é
muito mais fácil louvar do que confessar ignorância. Depois disso, que eu
saiba, não saiu mais nada de fôlego de seu lápis que ganhasse a mesma
notoriedade de "A Grande Síntese". Mas ele só caiu mesmo na malha dos
críticos mais exigentes quando se revelou adepto do monismo (o que é isso? O
Aurélio é quem explica: monismo é Doutrina Filosófica, segundo a qual o
conjunto das coisas pode ser reduzido à unidade, quer do ponto de vista de sua
substância, quer do ponto de vista das leis lógicas ou físicas, pelas quais o
universo se ordena. (O monismo poderá ser materialista ou espiritualista,
lógico e físico). Escorando-se nessa tendência Ubaldi criou uma teoria própria
que corre paralela ao Espiritismo que nada tem a ver com este. Ao meu ver
Pietro Ubaldi foi um espiritualista, mas não espírita.
J. B. ROUSTAING
Foi
destacado advogado da Corte Imperial de Bordeaux, na França. A vaidade doentia
estava à flor de sua pele. Após ler "O Livro dos Espíritos" e "O
Livro dos Médiuns", ambos de Allan Kardec, meteu em sua cabeça que com o
auxílio dos Espíritos Superiores que poderia fazer uma obra superior àquelas duas.
Note-se que em matéria espírita ele era calouro. Mesmo assim, não demorara a
evocar entidades espirituais para efetivar seu sonho: superar Allan Kardec. Ele
procurou a médium Emille Collignon, também uma novata na lide da mediunidade e
com sua cumplicidade evocou o Espírito
João Batista. Imagine! Logo o precursor de Jesus. Claro, Roustang não
poderia deixar por menos. Se Kardec se relacionava com o Espírito da Verdade,
ele pelo menos tinha que ter à disposição um João Batista. Mas como Espírito
não carrega Carteira de Identidade, o vaidoso advogado foi ludibriado, conforme
atesta sua obra "Os Quatro
Evangelhos", Atrás do falso João Batista vieram Moisés e os evangelistas
João, Lucas, Marcos e Mateus. Supostamente foram essas figuras do
cristianismo nascente que passaram no século XVIII a citada obra a Roustaing,
via Collignon. A obra, além de mistificadora traz um subtítulo que é verdadeiro
afronta à Doutrina Espírita: "Revelação
da Revelação". É muita pretensão, pois essa obra não suporta uma
simples análise à luz do Espiritismo e não é espírita, pois nem Roustaing, nem
a médium, muito menos os espíritos que a escreveram eram espíritas, quando
muito eram espiritualistas. Se a primeira condição de uma obra espírita é ter o
"imprimatum" da universalidade, "Os Quatro Evangelhos" é
refutado aí, pois foi recebido apenas por uma médium. Quando essa obra chegou
às mãos de Allan Kardec, ele elegantemente a refutou, insinuando que era uma
obra prolixa, pois disse que em vez de três volumes, o que ali está escrito
poderia ter sido enfeixado em dois e até mesmo num volume e o leitor ganharia
com este enxugamento. Mais tarde, Kardec ainda lembrou-se dela dizendo que
houve precipitação em trazer a lume certos assuntos como o corpo fluídico de
Jesus e prometeu desenvolver esse tema com maior profundidade. O que de fato o fez em “A Gênese”. E
disse que o tempo se encarregaria de aprovar ou não a obra de Roustaing. Na
França, ela não teve qualquer sucesso. Vindo para o Brasil, porém, encontrou
aqui os diretores da FEB, da época, receptivos e generosos. Logo a FEB, que se
intitula representante mor do Espiritismo no Brasil introduziu no movimento
espírita brasileiro essa obra que representa por razões óbvias o 1º Cisma do
Movimento Espírita. Não só a introduziu, como ao longo dos anos vem lhe dando
guarida em detrimento à Codificação Espírita. A obra em questão é
espiritualista e a FEB diz ser espírita. Não é um contra-senso? E ainda para a
nossa reflexão, faço aqui uma pergunta que já fiz alhures. Se essa obra foi
publicada quando ainda o Espiritismo estava para ser concluído, pois Allan
Kardec ainda não havia publicado "A Gênese", com que fechou a
Codificação da Doutrina Espírita, por que os espíritos que a ditaram à médium
Collignon não a ditaram para o Codificador? Será que esses espíritos já haviam
pulado da barca de Jesus? Isto, no mínimo, é muito suspeito! É bom que se diga
que no passado muitos espíritas de renome se diziam roustainguistas. Mas assim
que leram a obra de Roustaing calaram-se ou tornaram-se os seus maiores
críticos. E alguns até mesmo depois de desencarnados jamais falaram um
"o" a favor dela, a não ser dentro da FEB. Será que isso não diz nada?
EDGAR
ARMOUND
(O
Comandante Edgar Armound, como era chamado). Oficial da Força Pública do Estado
de São Paulo, hoje denominada Polícia Militar, chegou à Fededação Espírita do
Estado de São Paulo em 1939. Nessa época a FEESP dava seus primeiros passos já
que foi fundada em 1936. Homem inteligente e de palavra fácil, o Comandante
Edgar Armound foi pouco a pouco conquistando o seu espaço dentro da Instituição
Federativa. Lembremos que naquele tempo a literatura espírita era escassa.
Existiam os livros da Codificação e, além deles um ou outro livrinho de produção
independente. A promissora obra de Francisco Cândido Xavier, o nosso Chico
Xavier, estava ainda nos seus primeiros degraus. Armound logo constatou isso e
começou a escrever uns livrinhos mais simples, próprios para os iniciantes à
Doutrina Espírita. Eu diria que a inspiração dos cursos de Espiritismo que até
hoje estão em pleno vigor na FEESP
nasceu das páginas desses livrinhos do Armound. Cursos esses que estão em
todos os quadrantes do movimento espírita brasileiro e quiçá do exterior. O
Comandante Armound chegou, então, à Diretoria da FEESP. E como Secretário Geral
organizou a "Escola de Médiuns" e a "Escola de Aprendizes do
Evangelho". Hoje estas escolas acolhem mais de cinco mil alunos. E criou
também o passe padronizado que tem causado muita polêmica, porque é um ritual
muito distante da prática espontânea, intuitiva que fora exemplificada por
Jesus.
Sua
bibliografia compõe-se de 25 obras. As que fizeram mais sucesso foram "Passes e Irradiações" e "Os
Exilados de Capela". Foi ele também que trouxe para o nosso meio a
"Cromoterapia", que nada tem a ver com a Doutrina Espírita, mas que
hoje está espalhada graças um opúsculo escrito por ele e publicado pela Editora
Aliança. Devemos a ele também essa enxertia.
Em
maio de 1944, o Comandante Armound fundou o jornal "O Semeador",
órgão doutrinário da FEESP. Apoiado por um grupo de amigos fundou ainda a
Instituição Espírita "O Lar do Amor Cristão", em São Paulo e foi um
dos signatários da Ata de Fundação da USE - União das Sociedades Espíritas do
Estado de São Paulo. Além da Cromoterapia e do passe padronizado que ainda hoje
causam discussões no meio espírita e certamente serão questionados pelas
gerações espíritas do futuro, devo ainda mencionar que suas obras estão
carregadas de conceitos orientalistas, pois ele foi um grande estudioso das
principais religiões orientais. Termos como chacras, carma e outros de origem oriental foram enxertados por ele no movimento espírita brasileiro. “Ramatis, Pietro Ubaldi,
Roustaing e Edgar Armond há muito tempo estão na berlinda e seus críticos já
dissecaram suas obras de cabo a rabo. Considerei que o que já foi dito bastasse
para o público compreender os equívocos que esses escritores cometeram em
relação à Doutrina Espírita”. Há ainda em suas obras um legado místico
muito forte que tomou o movimento espírita brasileiro de assalto. Não bastasse
o bolor igrejeiro do roustainguismo, o misticismo e o orientalismo do
Comandante Armound que também trouxeram prejuízos sérios ao movimento espírita
brasileiro.
Alegando
problemas de saúde, Edgar Armound deixou a FEESP em 1966. E o estrago
armoundista no movimento espírita brasileiro iria se completar com a criação,
por ele próprio, da Aliança Espírita Evangélica que nasceu com vocação um tanto
velada, a princípio, federacionista e tornou-se em pouco tempo em nosso Estado
de São Paulo, concorrente da USE e da FEESP. A Aliança Espírita Evangélica é fortemente mística e orientalista e
os centros "espíritas" capitaneados por ela são todos místicos e
orientalistas, o que traz ao Espiritismo um dano imensurável. Tudo isso é uma
pena, pois a herança do Comandante Armound poderia ter sido bem melhor. Essa
minha análise, ainda que superficial, me autoriza a considerá-lo também,
espiritualista, mas não espírita.
Com
o devido respeito às outras linhas de pensamentos instaladas dentro do
Espiritismo, prefiro os Postulados de
Kardec, que não deixam margem à nenhuma suspeita nem distorções dogmáticas
advindas dos equívocos causados pelos seguidores "desorientados" de tais autores.